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| CRÍTICA: REPRISE DE "BELA, A FEIA" SE ENCERRA COMO UM ALÍVIO NA TELEDRAMATURGIA ATUAL DA RECORD TV

Até a estreia de "Topíssima" este ano na Record TV, sua última novela contemporânea havia sido "Vitória" em 2014. Curiosamente, ambas foram escritas por Cristianne Fridman. A partir de 2015, a emissora abandonou esse "estilo tradicional" para se dedicar a produções bíblicas e com o fenômeno "Os Dez Mandamentos" surgiram apenas segmentos dentro deste gênero.


Gisele Itié "conversa" sobre padrões de beleza e comportamento com sua Anabela Palhares / Sérgio Menezes faz parte de uma representatividade em dobro: homem negro e homossexual, bem resolvido em carreira e vida amorosa - Imagem: Record TV/Montagem.

Exibida desde novembro de 2018, a reprise "Bela, a Feia", dez anos depois de sua transmissão original, ganhou uma importância especial no contexto atual que a emissora vive. Sabe-se que a sua reapresentação dependeu de uma "liberação" da Televisa, já que é baseada no texto de "A Feia Mais Bela" (exibida pelo SBT em 2006 e 2014), que por sua vez, tem o texto original foi criado por Fernando Gaitán através de sua icônica "Betty, a Feia".

O sucesso se confirma pela adaptação eficiente realizada por Gisele Joras. O texto e a contextualização coerente à realidade brasileira traz personagens com diversos nuances. O abrasileiramento da história trouxe um frescor novo e ao mesmo tempo, uma identificação do público. Fotografia e direção, por exemplo, souberam explorar bem as belezas naturais do Rio de Janeiro com uma ambientação solar e com tons de cores vivas, unindo tramas paralelas e primárias. A construção das pessoas dentro da história também fugiu do enquadramento original, mas sem perder a essência. Aliada com uma linguagem popular, nada mais Brasil que samba, barezinhos, a vida de gente humilde que batalha diariamente, gente que tenta se dar às custas dos outros, socialites e caminhadas no calçadão na praia.

O casal protagonista formado por Gisele Itié e Bruno Ferrari são um charme, a química em cena é gigante e a maneira como a história dos dois é guiada, é linda. Até mesmo o desfecho da vilã Verônica (Simone Spoladore) é criativo, algo nunca visto por aqui: para fugir da polícia, corre para o Paraguai, se torna uma apresentadora infantil com uma nova identidade e passa a tentar suportar as crianças.

Mas o que mudou 10 anos depois? Pra começo de conversa, a novela envelheceu muito bem. Nada ficou datado ou perdido no tempo. Se compararmos com a posição política, religiosa e dramatúrgica atual da Record TV, é impossível negar as mudanças e o alívio que a novela trouxe para o panorama presente durante esta reprise. O mais evidente, sem dúvida, é a presença de personagens homossexuais na história. O núcleo de humor, do salão de beleza, trouxe o ator João Camargo como um dos mais afeminados.
O núcleo da empresa Mais Brasil, contou com Sérgio Menezes num personagem que corresponderia originalmente ao estilista Hugo Lombardi. Aqui se chamava Diogo Marques e era situado em cena com toques afeminados, um humor muito crítico e desprezo por quem estivesse abaixo dele. Era muito natural sua presença ali e a novela conseguiu mostrar um pouco da vida pessoal do personagem, relacionamentos e outras situações que ficaram subentendidas, mas mesmo assim, claras. Ainda um núcleo de bandidos e trambiqueiros encabeçados por André Mattos e Thierry Figueira, apareciam muitas vezes agindo na ilegalidade.
Além dos desfechos dos personagens, o último capítulo traz outra surpresa: o casal protagonista, Bela (Gisele Itié) e Rodrigo (Bruno Ferrari) se casam numa cerimônia numa igreja católica. Numa realidade que a Record TV e sua dramaturgia vive, agravado pela "supervisão" de Cristiane Cardoso, é proibida qualquer representação de homossexuais (a não ser que seja, talvez, negativa), igreja católica nem pensar, bandidagem menos ainda e resquícios de humor desapareceram.

O casal Bela e Rodrigo esbanjaram química juntos. No último capítulo, se casam em cerimônia em igreja católica - Imagem: Record TV/Reprodução.

A fórmula para o sucesso desta reprise de "Bela, a Feia" é simples: é uma história da moça feia que fica bonita e ainda funciona muito, seja pelo empoderamento feminino que a protagonista representa ou pela sensibilidade aos temas relacionados ao bullying e discriminação; por uma história de amor simples e bonita; pela trama leve, popular e de fácil entendimento.
Lamenta-se que a Record TV só foi começar a produzir novelas em alta definição (HD) em 2011, enquanto as outras já usavam essa tecnologia desde 2007/2008. 

"Bela, a Feia" sai de cena como a maior audiência das novelas da tarde da Record desde que a faixa de reprises foi criada em 2015, principalmente em seu horário, em comparação com as antecessoras. Deixa no ar a sua base, ainda atual, em dialogar sobre padrões de beleza e comportamento, e principalmente, como um marco de dez anos depois, trazer assuntos que a Record TV vetou da programação em nome das posições adotadas e mostrar como o público da emissora não compactua do que a própria emissora prega.



Obrigado pela visita e até a próxima!




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