| A CURIOSA E RÁPIDA PASSAGEM DAS NOVELAS PELA REDETV!

Lançada em novembro de 1999, após a falência que se deu na extinção da Rede Manchete, a RedeTV! é inaugurada com honras e curiosidade "substituindo" a emissora dos Bloch.  Naquela época a programação era diversificada e oferecia opções interessantes, como filmes em sessões temáticas e interativas, seriados de sucesso como "Friends" - que estava no auge de seu sucesso ainda. Rolavam ainda programas de clipes, infantis, games e revistas eletrônicas que marcaram uma geração, assim como o "Super Pop" (que tinha uma proposta melhor que hoje) e as sensacionalistas discussões dos programas de João Kléber, que faziam a alegria da audiência.

Demorou para a RedeTV! se interessar no nicho de teledramaturgia, mas aconteceu. Produção própria era um sonho distante e grande demais, então começaram com projetos pequenos. O pontapé inicial se deu com seriados infanto-juvenis realizados em parceria com a produtora Talentos Brilhantes e a ACP Produções, a partir de 2001, com "Caminhos da Fama" cujo investimento aproximado foi de R$ 2 milhões. No ano seguinte, a emissora traz a novela infanto-juvenil "O Sonho de Luiza", estrelada pela ex-Chiquititas Victória Rocha  que, com seus 230 capítulos, fez um relativo sucesso nas manhãs e levou a Talentos Brilhantes para o terceiro e último projeto no canal, "Aventura em Cabo Frio" (disponível no YouTube), que contava com uma pegada mais adolescente e trazia a praia como principal cenário.

Nos anos seguintes, foram produzidos e exibidos seriados como "Mano a Mano" e "Vila Maluca", além de um plágio descarado de "Chaves", no início de 2000, chamado de "Miguelito". Em 2007, uma parceria internacional entre Disney-ABC e Pol-ka Produciones possibilitou a realização de "Donas de Casa Desesperadas", um remake brasileiro (gravado na Argentina) da série "Desperate Housewives", que vinha sendo apresentada na emissora. O elenco contava com nomes de Sônia Braga, Lucélia Santos, Tereza Seiblitz, Viétia Zangrandi, Franciely Freduzeski e Isadora Ribeiro. Os resultados na audiência, infelizmente, ficaram abaixo do projetado.

Enfim, o investimento na teledramaturgia até aquele momento havia sido morno, o que pesava era o financeiro, a qualidade geral e a credibilidade dos produtos. 


O elenco reunido de "Betty, a Feia" - Imagem: Reprodução/RCN.

No ano de 2002, esse investimento ganha peso com sua primeira grande novela, trilhando um caminho mais barato e que viria a ser parte de sua história: a colombiana "Betty, a Feia". Criada por Fernando Gaitán e produzida pelo canal RCN em 1999, a trama fez muito sucesso em seu país de origem e contava as aventuras de Beatriz Pinzón Solano, chamada por todos de Betty, papel de Ana María Orozco. Ela era uma moça de aparência fora dos padrões, que desejava ter sucesso profissional e o amor de seu chefe. 

O diretor Amílcare Dalevo, em entrevista, revelou os planos de investir ainda mais na área. Por causa desse objetivo, a emissora "bateu o pé" e conseguiu tirar a Globo do páreo na compra dos direitos de transmissão, arcando com um custo de R$ 3 milhões, entre direitos autorais e tradução, além de dublar num dos maiores e melhores estúdios de dublagem do país, a Dublavídeo. Todo esse interesse surgiu graças ao sucesso que Betty fez nos 15 países onde foi transmitida (dados referentes à época citada). Na Colômbia, foi responsável por um incrível aumento de 20 pontos no canal RCN (de 31 para 51 pontos). O público fervoroso ainda pediu e conseguiu que a novela fosse transmitida até em emissoras de rádio.

No momento da negociação, as quatro cotas de patrocínio já haviam sido vendidas. A intenção de Amílcare era consolidar o terceiro lugar de audiência, o que o mesmo falou na coletiva de lançamento da novela. 

A estreia, em 27 de maio de 2002, exibida das 19h50 às 20h30, foi morna, ainda com média de 4 pontos e 5 de pico. Sua trajetória estava apenas começando e com o passar dos capítulos, uma parte maior do público começou a descobrir e conhecer a novela. Aos poucos, mais pessoas se compadeciam dos dramas de Betty, do Quartel das Feias e dava gargalhadas com o tom cômico dos personagens. Em junho a novela já chegava à médias de 6 pontos e animava ainda mais a RedeTV!, assim como Marcelo de Carvalho, que relatou surpresa, já que sua novela começava a competir com os últimos capítulos do fenômeno global "O Clone". A direção também planejava trazer a atriz protagonista para visitar o Brasil.

Com a conquista de público cada vez mais cativo e, contentes com o sucesso da história, a RedeTV! começava a segurar a edição. A ideia era prolongar a exibição por mais tempo e assim, a maior parte do capítulo do dia era composto das cenas do capítulo anterior e do capítulo do dia seguinte, gerando inúmeras reclamações de quem acompanhava. Apesar, a audiência se manteve intacta, confirmando a fidelidade do telespectador. Chegado o momento de se despedir de Betty, o grande final foi apresentado na noite de 28 de junho de 2003, com um total de 342 capítulos e a permanência, no ar, de mais de um ano. A audiência apontava 10 pontos. Posteriormente, de 2004 a 2006, a novela seria reprisada à tarde, alongada em extremo.


"Pedro, o Escamoso" entrou para a badalada lista de novelas com títulos estranhos exibidas no Brasil - Imagem: Reprodução/Facebook.

Dividindo o horário por duas semanas na tentativa de segurar o público da faixa, a RedeTV! lança, na noite de 16 de junho de 2003, "Pedro, o Escamoso". Apesar das semelhanças aparentes pelo título, uma história não tem nada a ver com a outra. Escamoso é uma expressão colombiana para definir uma pessoa que tentar ser algo que não é. Então, essa tradução pode ser sido proposital para despertar a curiosidade e familiarizar quem estava assistindo Betty.
"Pedro" se tornou uma sucesso em diversos países da América Larina como Argentina, Venezuela, Nicarágua, Costa Rica e até mesmo nos EUA. Na história, o personagem-título foge de uma pequena cidade do interior da Colômbia por enrolos com mulheres. Ele possui uma beleza questionável, porém, é mulherengo e costuma ostentar o que não é e o que não tem.

Segundo matéria do site Babado Ig, a aquisição da novela se deu pelo sucesso da mesma na Colômbia enquanto competia com Betty. Outra curiosidade é que os direitos de exibição teriam sido adquiridos um ano antes, mas haviam outros interessados, então as negociações foram retomadas no final de 2002. Para a transmissão, foram desembolsados U$$ 3 milhões à emissora.
Mônica Pimentel, diretora artística na época, comentou sobre a novelas e os planos futuros. O núcleo de teledramaturgia estava fora de cogitação, mas continuariam a investir nessas "novelas estrangeiras". Ela ainda comentou que estavam negociando outras quatro produções, incluindo "Ecomoda", a continuação de "Betty, a Feia" e, a venezuelana "Minhas Três Irmãs".

Todas as quatro cotas de patrocínio já haviam sido vendidas antes da estreia, a um valor de R$ 1,2 milhão. Apesar da boa divulgação, a estreia aconteceu de forma morna e, após o findar de Betty, o telespectadores começaram a fugir. Uma das possíveis justificativas podem estar ligadas ao estranhamento e confusão que a dublagem causou, por um erro de estratégia do canal: a dublagem. Dublada em SP, no estúdio Dublavídeo, a exigência era que os protagonistas tivessem as mesmas vozes de Betty e Armando, então, Alexandre Marconato deu voz ao Pedro, enquanto Fátima Noya à Sandra.  Quem acompanhava não aprovou, achou confuso e que aquelas vozes não "combinavam" com os personagens. Com as reclamações, a direção da emissora percebeu, já tarde, o erro cometido. Então, a voz de Pedro foi trocada com a novela no ar, quando o dublador Élcio Sodré assumiu o personagem. O curioso é  terem seguido esse caminho inverso, já que é muito comum que as emissoras tenham o cuidado de evitar a repetição de vozes.

"Pedro, o Escamoso" passou longe do sucesso da antecessora, no Brasil, chegando até a virar piada. A edição foi adiantada conforme a audiência não correspondeu com as expectativas: o Ibope caiu de 7 pontos para 2 no horário, mas se esperava que melhorasse assim como Betty, que teve um aumento surpreendente no terceiro mês em exibição. O último capítulo foi apresentado em 06 de março de 2004 com um total de 226 capítulos e a média geral de 2 pontos (no arrendondado).


Depois do programa "A Casa é Sua", as donas de casa continuavam ligadinhas na RedeTV pra assistir "Gata Selvagem" - Imagem: Divulgação/Venevision.

Enquanto "penavam" com o escamoso à noite, a direção da RedeTV! se empolgou e lançou em 03 de novembro de 2003, à tarde, por volta das 15h40, "Gata Selvagem". Fenômeno de exportação e sucesso em vários países, esta foi uma produção da Fonovideo, talvez a única a conseguir êxito, à ponto de se tornar um símbolo dentro  do nicho das novelas latinas.
Protagonizada por Marlene Favela e Mario Cimarro, esse hit latino foi exibido com uma inovação: Nelson Rubens "apresentava" a novela. No início do capítulo e nos intervalos, o fofoqueiro do "TV Fama" surgia, num fundo de chroma-key comentando o que estava acontecendo, criava um suspense quanto aos próximos capítulos e fazia merchandising. Era bizarro, mas pode ter dado certo, como interação e companhia para as donas de casa que sintonizavam ali.

Novamente, a dublagem de novelas da RedeTV! culminava em algum tipo de "dor de cabeça". No embalo das decisões, a novela foi mandada para dublagem no RJ, no extinto e referencial estúdio Herbert Richers. Como não estavam acostumados, não conseguiram manter os custos e se enrolaram com os pagamentos. Com isso, a partir do capítulo 47, passou a ser dublada em SP, na Dublavídeo, como de costume, quando todos os personagens tiveram suas vozes trocadas.

O dramalhão angariou um público fiel com 2 pontos de média, o que foi um sucesso, a começar por ser um horário incomum para este tipo de atração no canal. O capítulo final foi ao ar em 03 de dezembro de 2004, com um total de 273 capítulos e substituída pela reprise de "Betty, a feia".


Quem assistiu "Paixões Ardentes" na RedeTV  não soube como terminou a vingança dos irmãos Reis, mas dá pra descobrir na Netflix! - Imagem: Divulgação/Telemundo.

O capítulo final das transmissões de novelas na RedeTV! começava com a estreia de "Paixões Ardentes", que entrou no ar às 19h15 de 29 de março de 2004 e "terminaria" em tom trágico. Após um pequeno hiato entre as novelas da noite, de quase um mês, o novo dramalhão, distribuído com êxito pela Telemundo, teria no Brasil a missão de chamar o público de novelas sozinho desta vez. No horário, havia uma competição direta entre Globo (com "Da Cor do Pecado") e SBT (com "Poucas, Poucas Pulgas" e posteriormente, "Amy, a menina da Mochila Azul"). A luta ia ser grande e as dificuldades surgiram desde o começo: além de não ter conseguido vender nenhuma cota de patrocínio, a estreia registrou apenas 0,8 pontos.

Com o passar dos capítulos, ficava claro que a situação não iria melhorar. Dificilmente ultrapassava de 1 ponto, chegando ao extremo de zerar a audiência da RedeTV!. Após a transmissão do capítulo 60, a emissora tomou uma decisão drástica  e a retirou do ar naquela altura, sem final nem nada. No mesmo instante, a dublagem foi paralisada e nunca foi retomada. Em um curto comunicado, a emissora anunciou o cancelamento: "Por estratégia de programação, a RedeTV altera sua grade a partir de 1º de julho. 'Paixões Ardentes' deixa de ser exibida a partir desta data e fecha seu ciclo no capítulo 60. A emissora pede desculpa pelos transtornos e pede a compreensão do público".

Diante disso, a Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro anunciou um processo contra a RedeTV! pelo cancelamento da novela, com uma ação movida pela advogada Adriana Lacaz. Segundo ela, o canal de TV violou várias disposições e normas das leis de proteção ao consumidor. Procurada, através de contatos de telespectadores, a emissora "prometeu" que a trama retornaria à programação, à tarde, no lugar de "Gata Selvagem", o que nunca aconteceu.

A história da RedeTV com as novelas pode ser contada como algo que durou pouco tempo, foi muito alongada, passou por altos e baixos, equívocos e um final daqueles de dar ódio. Fica a dúvida: será Betty a lenda e a única capaz de colocar o Brasil pra assistir novela na RedeTV?



Obrigado pela visita e até a próxima!

Comentários

  1. Betty é Betty, e a última reprise começou já entrando nos 2 pontos e ia subir bonito, até começarem a avacalhar com a novela e melar com tudo.

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